Rapadura Espiritual

O céu: nossa meta, nossa casa, Deus para sempre

“Para o céu, na esperança de chegar…”, “Sou estrangeiro aqui, o céu é meu lugar…” e quem não se lembra entre os mais antigos do “com minha mãe estarei, na santa glória um dia…” e outras músicas que falam muito oportunamente desta feliz realidade, desta consoladora verdade, desta meta, deste ponto de chegada que é o Paraíso. Que bom que é assim. O Catecismo da Igreja Católica nos ensina que o céu é a vida perfeita com a Santíssima Trindade, comunhão de vida e de amor com o Deus uno e trino, com a Virgem Maria, com os anjos e todos os bem-aventurados. Trata-se do fim último e realização das aspirações mais profundas do homem, o estado de felicidade supremo e definitivo. Cada um conservará sua própria identidade, mas viverá em Cristo. O Céu é o estágio onde cada pessoa verá a Deus tal como Ele é. A isso, chamamos de “visão beatífica”. São pessoas que reinam com Cristo e vivem a experiência plena, em toda a sua perfeição da posse dos bens que não lhes serão tirados, pois “reinarão pelos séculos dos séculos” (Ap 22, 5) com o Senhor (Cf. Catec. Igr. Cat. 1023-1029).

Este mês de novembro é sempre tradicionalmente dedicado à meditação das realidades definitivas, os novíssimos, as realidades escatológicas que falam do destino definitivo de cada homem e de cada mulher que a cada dia, escolhem, fazem opções, dando uma direção à própria vida. E  todos colherão aquilo que plantaram. Ora, pensar no céu é pensar em verdades que não conhecemos plenamente, mas que sabemos que existem e esperamos atingir tão feliz meta. No entanto, quanto maior é a amizade com Deus, tanto mais caem os véus e esta verdade passa a ser misteriosamente familiar para algumas pessoas. No entanto, apostolo Paulo, que fez experiências místicas profundas, afirma categoricamente: “O que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram, e o coração do homem não percebeu, isso Deus preparou para aqueles que o amam” (1Cor 2, 9), o que não quer dizer que seja uma realidade inacessível aqui e agora. É preciso ter saudade do céu, aspirá-lo ardentemente, querer ir para lá. Isso mesmo: precisamos pensar mais, aspirar mais, levá-lo mais em consideração, ter como meta esta bem-aventurança eterna. É lá a nossa verdadeira pátria, nosso lar onde com a Família Trinitária seremos um, fazendo comum unidade com os santos e anjos.  Deus será a felicidade eterna de seus amados que corresponderam ao seu amor, às suas graças e que por isso contemplam a beleza, a verdade e a bondade divinas. Nunca se saciarão, pois quanto mais O contemplam, mas anseiam por fazê-lo num ciclo virtuoso extremamente feliz. Eles não poderiam explicar. Qualquer tentativa de explicação desta experiência eterna é inútil. O tempo e o espaço se extinguem para dar lugar à Felicidade que é para sempre. Meu Deus! Pense bem…, LONGE DO PECADO, DA CORRUPÇÃO, DO PECADO E DA MORTE, NO CÉU VOCÊ SERÁ FELIZ INFINITAMENTE, REALIZADO, PLENIFICADO, TUDO O QUE SONHOU SE REALIZARÁ, SEM DORES, SEM DÚVIDAS, SEM MEDO, LONGE DOS PERIGOS, SEM A POSSIBILIDADE DE PERDER  DEUS, EIS A FELICIDADE SEM FIM, PARA SEMPRE, PELOS SÉCULOS, DOS SÉCULOS…!!!  Por isso, dizia São Francisco de Sales: “É tão grande o bem que espero, que a dor com prazer tolero”. Os santos pensavam mais nesta feliz bem-aventurança e por isso se animavam nesta esperança que nunca decepcionará (Cf. Rm 5,5) pois quem promete é o próprio Senhor que é fiel. Os mártires não hesitaram de sofrer as mais penosas torturas e a morte, os confessores se submeteram às renúncias e aos sacrifícios que sua vocação exigia porque sabiam muito bem que tudo aquilo não seria em vão. Estes homens e mulheres, “alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração” (Cf. Rm 12,12) se deixaram conquistar por Deus, conquistaram-se a si mesmos e conquistaram as outras pessoas para o Reino, animados por esta certeza de verdades invisíveis, tornadas visíveis pela confiança na revelação de Deus que é verdadeiro e fiel. Não era à toa que um DDD (“doidim de Deus”) chamado São Felipe Neri gritava nas ruas de Roma jogando o chapéu para cima: “paraíso, paraíso” (não precisa fazer exatamente isso!). Este tipo de gente aguardava a morte como passagem para este encontro definitivo e feliz com quem eles amavam, serviam e sadiamente temiam. Eram felizes nesta vida (apesar das não poucas tribulações e provações, tentações e lutas) e muito mais felizes passaram a ser depois que entraram na verdadeira vida! Santa Teresa no momento de sua morte disse ao Senhor: “Enfim meu amado, chegou a hora de nos vermos”. São João Maria Vianney dizia que se o paraíso não existisse, ele já se sentia feliz por ter amado o bom Deus. E sua vida foi cheia de enormes sacrifícios com jornadas longuíssimas de confissões, de tantos jejuns e vigílias, de pobreza e de privações. E já achava que sua vida já tinha sido um paraíso porque tinha sido amigo de Deus. Eram felizes porque amavam a Deus na gratuidade! E nós? Que loucura, que insanidade, que burroligência ou intelijumência profundas pensar que esta felicidade é só pra eles! É pra todos nós! Você, eu, nós e não apenas vós ou eles e elas. Hoje, o sonho lindo e profundo do paraíso, precisa ser “sonhado”, é preciso querer ir para Deus a cada dia, “pedra por pedra, com esperança de ver Jesus”. E mais do que nunca é preciso estar alertas, pois as forças tenebrosas do mal tentam de todo jeito criar distrações para os cristãos. A vida terrena nunca esteve tão atraente: remédios potentes alongam a vida, a qualidade da alimentação, as facilidades que os meios de transporte e comunicação transformaram o mundo numa aldeia global. As facilidades compradas pelo dinheiro, o endeusamento da beleza, a idolatria do prazer, os passa-tempo, as tantas possibilidades oferecidas pela tecnologia, as mentalidades marcadamente imbuídas de relativismo e subjetivismo, o permissivismo e a ausência de limites deixaram espaço para uma construção da vida de cada um seguindo caprichos egoístas ou critérios de conduta desprovidos de valores. E isso, faz com que as pessoas acreditem ser a vida um bem para ser gozado ao máximo aqui e agora como se isso fosse um bem supremo. A morte passa a ser adiada ao máximo, pois ela é sempre considerada como um espectro, o fim de tudo. E ninguém se iluda, pois esta mentalidade constitui um pernicioso dióxido de carbono a poluir o ar da fé que os cristãos respiram. Podem também aliciar os que crêem, a viver como se aqui fosse a pátria definitiva, afinal, são prazerosas e gratificantes as coisas desta vida.

Certamente, promover a vida plenamente passa também pela promoção da saúde, da educação, da moradia, da distribuição de renda com equidade, do aumento do poder aquisitivo da população, a possibilidade de trabalho e de salários dignos, de segurança, de leis justas, a cidadania operacionalizada na participação consciente e democrática de todos, etc. É lícito que tudo isso seja compreendido como qualidade de vida. Mas, seria muito redutivo que tal compreensão ficasse estacionada aqui. De que adianta ter tudo isso, sem a amizade de Deus? Sem o sentido da eternidade? De que adianta tudo isso se for perdida a felicidade definitiva do Céu? Certamente é preciso manter os pés bem fincados no chão da história, da realidade pessoal, social, econômica, política, urge haver por parte de cada homem e mulher de Igreja uma consciência crítica, atenta do que acontece. É preciso participar o mais ativamente quanto possível do processo de construção da sociedade, na nação. Ser sal da terra e luz do mundo é isso (cf. Mt 5, 13-16) , mas sem prejuízo da consciência iluminada e transfigurada da certeza que tudo passa e só Deus permanece. Além disso, o projeto de felicidade dos eleitos é o cumprimento pleno desta felicidade que todos ansiamos de viver. Sem ser um bando de “Alice no país das maravilhas”, os cristãos também não serão uns “maravilhados por um país maravilhoso que não lhes pertence” como realidade definitiva. Corações ao alto e os pés no chão.

A evangelização não pode se omitir em acordar o desejo do céu, em manter fixo o olhar nos bens definitivos, antes que o consumismo e o hedonismo façam seus estragos, gerando mentalidades arredias e indiferentes a uma felicidade que é para sempre. Importa que o desejo do céu seja acordado, para que não se contentem com míseras migalhas de um alimento de baixo poder nutritivo, quem foi chamado a fartar-se de ricas iguarias na casa do Pai.

“Foi em Cristo que Deus Pai nos escolheu já bem antes de o mundo ser criado, para que fôssemos, perante a sua face, sem mácula e santos pelo amor” (Flp 1, 4).


Comentários

Aviso: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião da Comunidade Shalom. É proibido inserir comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem os direitos dos outros. Os editores podem retirar sem aviso prévio os comentários que não cumprirem os critérios estabelecidos neste aviso ou que estejam fora do tema.

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *.

O seu endereço de e-mail não será publicado.