DISCURSO DO PAPA BENTO XVI
AOS PRELADOS DA CONFERÊNCIA NACIONAL
DOS BISPOS DO BRASIL (REGIONAL NORDESTE V)
EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM»

Quinta-feira, 28 de Outubro de 2010 (antes das eleições presidenciais)

Amados Irmãos no Episcopado,

«Para vós, graça e paz da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo» (2 Cor1, 2). Desejo antes de mais nada agradecer a Deus pelo vosso zelo e dedicação a Cristo e à sua Igreja que cresce no Regional Nordeste 5. Lendo os vossos relatórios, pude dar-me conta dos problemas de caráter religioso e pastoral, além de humano e social, com que deveis medir-vos diariamente. O quadro geral tem as suas sombras, mas tem também sinais de esperança, como Dom Xavier Gilles acaba de referir na saudação que me dirigiu, dando livre curso aos sentimentos de todos vós e do vosso povo.

Como sabeis, nos sucessivos encontros com os diversos Regionais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, tenho sublinhado diferentes âmbitos e respectivos agentes do multiforme serviço evangelizador e pastoral da Igreja na vossa grande Nação; hoje, gostaria de falar-vos de como a Igreja, na sua missão de fecundar e fermentar a sociedade humana com o Evangelho, ensina ao homem a sua dignidade de filho de Deus e a sua vocação à união com todos os homens, das quais decorrem as exigências da justiça e da paz social, conforme à sabedoria divina.

Entretanto, o dever imediato de trabalhar por uma ordem social justa é próprio dos fiéis leigos, que, como cidadãos livres e responsáveis, se empenham em contribuir para a reta configuração da vida social, no respeito da sua legítima autonomia e da ordem moral natural (cf. Deus caritas est, 29). O vosso dever como Bispos junto com o vosso clero é mediato, enquanto vos compete contribuir para a purificação da razão e o despertar das forças morais necessárias para a construção de uma sociedade justa e fraterna. Quando, porém, os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem, os pastores têm o grave dever de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas (cf. Gaudium et spes, 76).

Ao formular esses juízos, os pastores devem levar em conta o valor absoluto daqueles preceitos morais negativos que declaram moralmente inaceitável a escolha de uma determinada ação intrinsecamente má e incompatível com a dignidade da pessoa; tal escolha não pode ser resgatada pela bondade de qualquer fim, intenção, conseqüência ou circunstância. Portanto, seria totalmente falsa e ilusória qualquer defesa dos direitos humanos políticos, econômicos e sociais que não compreendesse a enérgica defesa do direito à vida desde a concepção até à morte natural(cf. Christifideles laici, 38). Além disso no quadro do empenho pelos mais fracos e os mais indefesos, quem é mais inerme que um nascituro ou um doente em estado vegetativo ou terminal? Quando os projetos políticos contemplam, aberta ou veladamente, a descriminalização do aborto ou da eutanásia, o ideal democrático – que só é verdadeiramente tal quando reconhece e tutela a dignidade de toda a pessoa humana – é atraiçoado nas suas bases (cf. Evangelium vitæ, 74). Portanto, caros Irmãos no episcopado, ao defender a vida «não devemos temer a oposição e a impopularidade, recusando qualquer compromisso e ambigüidade que nos conformem com a mentalidade deste mundo» (ibidem,82).

Além disso, para melhor ajudar os leigos a viverem o seu empenho cristão e sócio-político de um modo unitário e coerente, é «necessária — como vos disse em Aparecida — uma catequese social e uma adequada formação na doutrina social da Igreja, sendo muito útil para isso o “Compêndio da Doutrina Social da Igreja”» (Discurso inaugural da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, 3). Isto significa também que em determinadas ocasiões, os pastores devem mesmo lembrar a todos os cidadãos o direito, que é também um dever, de usar livremente o próprio voto para a promoção do bem comum (cf. Gaudium et spes 75).

Neste ponto, política e fé se tocam. A fé tem, sem dúvida, a sua natureza específica de encontro com o Deus vivo que abre novos horizontes muito para além do âmbito próprio da razão. «Com efeito, sem a correção oferecida pela religião até a razão pode tornar-se vítima de ambigüidades, como acontece quando ela é manipulada pela ideologia, ou então aplicada de uma maneira parcial, sem ter em consideração plenamente a dignidade da pessoa humana» (Viagem Apostólica ao Reino Unido, Encontro com as autoridades civis, 17 de setembro de 2010).

Só respeitando, promovendo e ensinando incansavelmente a natureza transcendente da pessoa humana é que uma sociedade pode ser construída. Assim, Deus deve «encontrar lugar também na esfera pública, nomeadamente nas dimensões cultural, social, econômica e particularmente política» (Caritas in veritate, 56). Por isso, amados Irmãos, uno a minha voz à vossa num vivo apelo a favor da educação religiosa, e mais concretamente do ensino confessional e plural da religião, na escola pública do Estado.

Queria ainda recordar que a presença de símbolos religiosos na vida pública é ao mesmo tempo lembrança da transcendência do homem e garantia do seu respeito. Eles têm um valor particular, no caso do Brasil, em que a religião católica é parte integral da sua história. Como não pensar neste momento na imagem de Jesus Cristo com os braços estendidos sobre a baía da Guanabara que representa a hospitalidade e o amor com que o Brasil sempre soube abrir seus braços a homens e mulheres perseguidos e necessitados provenientes de todo o mundo? Foi nessa presença de Jesus na vida brasileira, que eles se integraram harmonicamente na sociedade, contribuindo ao enriquecimento da cultura, ao crescimento econômico e ao espírito de solidariedade e liberdade.

Amados Irmãos, confio à Mãe de Deus e nossa, invocada no Brasil sob o título de Nossa Senhora Aparecida, estes anseios da Igreja Católica na Terra de Santa Cruz e de todos os homens de boa vontade em defesa dos valores da vida humana e da sua transcendência, junto com as alegrias e esperanças, as tristezas e angústias dos homens e mulheres da província eclesiástica do Maranhão. A todos coloco sob a Sua materna proteção, e a vós e ao vosso povo concedo a minha Benção Apostólica.

Fonte: Voto Católico

Durante a eleição presidencial do ano passado, o Partido dos Trabalhadores tentou silenciar os Bispos católicos que mais abertamente denunciaram os aspectos agressivos à vida dos nascituros, ao matrimonio e à família presentes no programa político e nas práticas de governo da sigla.

Agora, voltamos a sentir o sabor amargo daqueles dias. Hoje, quatro sacerdotes da Arquidiocese de Belo Horizonte foram obrigados a se apresentar nas instalações da Polícia Federal para dar esclarecimentos sobre seu suposto envolvimento na divulgação, durante o período eleitoral do ano passado, do“Apelo a todos os brasileiros e brasileiras”, assinado pela Presidência e pela Comissão Representativa dos Bispos do Regional Sul 1 da CNBB.

Seis messes depois da eleição Presidencial, quatro sacerdotes, sob acusação de crime eleitoral, são  chamados para depor. E não só isso; além dos presbíteros, todos eles da região central da capital, também recebeu intimação da Polícia Federal o Arcebispo Metropolitano Dom Walmor Oliveira de Azevedo, que respondeu por escrito.

Cabe sinalizar que membros da própria Polícia Federal se mostraram constrangidos por terem sido obrigados a dar curso ao interrogatório dos membros do clero. A acusação de crime eleitoral e a consequente demanda partiram — até onde sabemos — do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores.
Crime eleitoral? Sob qual base? Fundamentados em quê?
Nem o Arcebispo, nem os quatro sacerdotes ordenaram a divulgação do “Apelo” em sua jurisdição. Mas, ainda que o tivessem feito isso, trata-se de um documento de um órgão da Conferencia Episcopal, devidamente assinado, que contém apenas a enumeração de fatos concretos.

Então, se o Prelado e os presbíteros tivessem solicitado sua divulgação, não haveriam incorrido em delito nenhum. De fato, o Santo Padre, no seu célebre discurso de 28 de outubro, dirigindo-se aos Prelados do Brasil, confirmou o “grave dever dos bispos de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas”.
Quanto à legalidade ou ilegalidade do “Apelo”, em 30 de outubro do ano passado a Vice-Procuradora Geral Eleitoral Sandra Cureau apresentou um parecer que qualifica dentro dos marcos da lei o texto e divulgação do Apelo, pois, embora o material recomende votar “somente em candidatos ou candidatas e partidos contrários ao aborto”, seu conteúdo “não pode ser conceituado como propaganda eleitoral, pois não foi elaborado por candidato ou partido político”.

No mesmo parecer, Cureau considera ilegal a tentativa de barrar a divulgação do “Apelo”, já que isso significaria violar vários dispositivos constitucionais e da lei eleitoral que garantem a liberdade de expressão. Na época, uma liminar solicitada pelo Partido dos Trabalhadores, e concedida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ordenou a apreensão de um milhão de cópias “Apelo”, solicitadas a uma empresa gráfica pela Diocese de Guarulhos. Todavia, os mesmos foram devolvidos depois do parecer da Vice-Procuradora.
Em vista desse antecedente, o que pretende então o Diretório mineiro do PT? Calar a Igreja, amedrontá-la, coagi-la, como tentou fazê-lo o Diretório Nacional durante a eleição Presidencial?  O livro dos Atos dos Apóstolos nos diz que quando Pedro e João foram chamados diante do Sinédrio, que lhes ordenou “que absolutamente não falassem nem ensinassem em nome de Jesus”, eles corajosamente responderam “não podemos calar”.

Pois bem, hoje, como ontem, a Igreja não pode se calar, e disso tivemos belos exemplos na eleição passada. Quando há Pastores corajosos dispostos a defender suas ovelhas, se for necessário com a própria vida, então os frutos são muitos, as ovelhas reconhecem o Pastor e a confiança na Igreja de Cristo se consolida.

Primeira lição: a eficiência da menção de candidatos e partidos

É costume que, em período eleitoral, os Bispos orientem os fiéis a votar em candidatos honestos, tementes a Deus, defensores da vida e da família, contrários ao aborto, ao homossexualismo e à prostituição.

Essa orientação genérica tem eficácia reduzida. Limita-se a enunciar uma premissa maior (“vote em candidatos com tais qualidades”), deixando aos eleitores a incumbência de formular a premissa menor (“este candidato temnão tem tais qualidades”) e a conclusão (“possonão posso votar neste candidato”).

Seria ilusório esperar que os 135.804.433 eleitores brasileiros fossem capazes de verificar, por si mesmos, que candidatos preenchem esses requisitos. E isso pelos seguintes motivos:

Primeiro, grande parte dos eleitores tem pouca instrução.

Segundo, mesmo os eleitores mais instruídos nem sempre têm tempo de fazer uma pesquisa detalhada e segura sobre cada candidato.

Por fim, assim como “de noite, todos os gatos são pardos”, em época eleitoral todos os candidatos se apresentam como defensores da vida e contrários ao aborto, se verificam que isso pode atrair votos.

O que fez a diferença entre as eleições 2010 e as dos anos anteriores é que um grupo de Bispos ousou adentrar na premissa menor. Refiro-me à Presidência e à Comissão Representativa dos Bispos do Regional Sul 1 da CNBB, que em 26 de agosto de 2010 aprovaram o documento intitulado “Apelo a todos os brasileiros e brasileiras, recomendando a sua “ampla difusão”.

O texto do “Apelo” continha a premissa maior: “Recomendamos encarecidamente a todos os cidadãos e cidadãs brasileiros e brasileiras […] que, nas próximas eleições, dêem seu voto somente a candidatos ou candidatas e partidos contrários à descriminalização do aborto”.

Mas, ao contrário do habitual, o texto trazia também vários fatos importantes relativos à premissa menor: o Partido dos Trabalhadores é favorável à descriminalização do aborto.

Assim, os leitores do “Apelo” ficaram conscientes de que não poderiam votar em candidatos do PT sem traírem suas promessas batismais. Como esse documento começou a ser de fato amplamente difundido por todo o Brasil, a candidata Dilma Rousseff (PT) passou a cair vertiginosamente nas pesquisas eleitorais. Frustrou-se a sua esperança de vencer em primeiro turno.

No segundo turno, ela tomou as seguintes providências:

a) apresentou-se como “católica”, defensora da vida, “pessoalmente (sic) contra o aborto” e até mesmo devota de Nossa Senhora Aparecida (ao lado de seu cabo eleitoral Gabriel Chalita);

b) requereu ao Tribunal Superior Eleitoral que apreendesse dois milhões de exemplares do temido documento, que acabavam de ser impressos em uma gráfica de São Paulo, a pedido do bispo de Guarulhos (SP) Dom Luiz Gonzaga Bergonzini. Lamentavelmente o Ministro Henrique Dias (TSE) concedeu uma liminar arbitrária determinando a apreensão de todo aquele material informativo. A ilegalidade da liminar foi reconhecida pelo Ministério Público Eleitoral em 30/10/2010, mas até hoje – que morosidade! – o TSE ainda não deu uma decisão definitiva de mérito.

c) divulgou em 15/10/2010 uma carta intitulada “Mensagem da Dilma”, na qual, contrariando sua posição de 2007, defendeu a “manutenção da legislação atual sobre o assunto” [aborto], e prometeu não promover “nenhuma iniciativa que afronte a família”.

Importa salientar que esse compromisso da candidata é absolutamente desprovido de valor. Ele pode ser descumprido sem qualquer sanção. O compromisso válido é o que ela assinou ao candidatar-se pelo PT, por força do que diz o Estatuto de seu Partido:

Art. 128. São pré-requisitos para ser candidato do Partido:

[…]

c) assinar e registrar em Cartório o “Compromisso Partidário do Candidato Petista”, de acordo com modelo aprovado pela instância nacional do Partido, até a realização da Convenção Oficial do Partido.

§ 1º A assinatura do “Compromisso Partidário do Candidato Petista” indicará que o candidato está previamente de acordo com as normas e resoluções do Partido, em relação tanto à campanha como ao exercício do mandato.

Note-se que Dilma Rousseff, como todo candidato pelo PT, assinou e registrou em cartório o “Compromisso Partidário do Candidato Petista” acima mencionado. Na ocasião, ela se comprometeu a acatar as “normas e resoluções do Partido”. E esse compromisso vale, não apenas para a campanha eleitoral, mas também para o “exercício do mandato”. Uma vez eleita presidente da República, ela está obrigada a exercer seu mandato de acordo com as resoluções do PT.

Entre as resoluções que ela se comprometeu a seguir está uma denominada “Por um Brasil de mulheres e homens livres e iguais” aprovada no 3º Congresso do PT (agosto/setembro 2007), que inclui a “defesa da autodeterminação das mulheres, da descriminalização do aborto e regulamentação do atendimento a todos os casos no serviço público.

Esse sim foi um compromisso válido. Se, por mera hipótese, Dilma se recusasse a cumprir essa resolução partidária, seria punida pelo Partido, como prescreve o Estatuto no parágrafo seguinte:

Art. 128 § 2º Quando houver comprovado descumprimento de qualquer uma das cláusulas do “Compromisso Partidário do Candidato Petista”, assegurado o pleno direito de defesa à parte acusada, o candidato será passível de punição, que poderá ir da simples advertência até o desligamento do Partido com renúncia obrigatória ao mandato.

Dilma, portanto, como todo político eleito pelo PT, não tem escolha: ela está obrigada a usar seu mandato para defender o aborto.

Segundo uma frase atribuída a François, Duque de La Rochefoucauld (1623-1680), “a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”. Ao disfarçar-se de defensora da vida e da família, Dilma prestou homenagem à causa que ela detesta. Sua simulação foi o reconhecimento de que a vida e a família são valores importantes, ao menos para fins eleitorais.

Tudo isso demonstra como é eficiente divulgar aos eleitores o nome de partidos incompatíveis com a doutrina cristã. Desta vez os Bispos se restringiram ao PT e sua candidata à presidência. Nada impede que, em outras eleições, sejam incluídos nomes de outros partidos e candidatos comprometidos com o aborto.


Segunda lição: a ineficácia e o perigo dos termos de compromisso

Houve líderes pró-vida que, com a melhor das intenções, passaram a convocar os candidatos para que assinassem um “termo de compromisso” em defesa da vida. A lista dos subscritores desse termo foi divulgada na Internet como a relação dos que estavam aptos a receber os votos dos cristãos.

A eficácia dessa iniciativa é pequena, pois a assinatura do termo não cria qualquer vínculo jurídico nem expõe o signatário a qualquer tipo de sanção. O mais grave, porém, é que o tiro pode sair pela culatra, pois não se põe nenhum pré-requisito para que um candidato ponha seu nome no documento. Nestas eleições, vimos de tudo, inclusive candidatos do PT – logo, comprometidos oficialmente com o aborto! – entre os que assinaram o termo de compromisso pela vida. Isso certamente contribuiu para gerar confusão entre os eleitores.

Antes de pedir a um candidato que faça um compromisso com os eleitores, é preciso ver que compromissos ele já fez com o próprio partido (como o PT, o PV e outros, que exigem compromisso com o aborto). É preciso em seguida ver como eles votaram, como parlamentares, as propostas legislativas relativas à vida e à família. As promessas eleitorais devem ocupar o último lugar.


Terceira lição: não exigir o candidato ideal

Houve eleitores que, na falta de candidatos cem por cento pró-vida, optaram por votar nulo ou em branco. Essa atitude lamentável serviu apenas para facilitar a vitória de Dilma Rousseff. Dom Raymond L. Burke, prefeito do Supremo Tribunal da Signatura Apostólica, esclareceu em 20/10/2010 como deve ser o comportamento do eleitor cristão:

Não se pode jamais votar em alguém que favoreça absolutamente o direito de uma mulher de destruir uma vida humana em seu seio ou de procurar um aborto.

Em algumas circunstâncias em que não exista nenhum candidato que se proponha a eliminar todo e qualquer aborto, pode-se escolher o candidato que mais limite esse grave mal em nosso país; mas jamais seria justificável votar num candidato que não só não quer limitar o aborto mas entende que ele deva estar ao alcance de todos.

Infelizmente, no segundo turno, estando entre José Serra (que admite o aborto em caso de estupro) e Dilma Rousseff (que deseja sua completa descriminalização), os eleitores nem sempre souberam optar pela restrição do dano. Essa lição não pode ser esquecida nas próximas eleições.

Anápolis, 12 de dezembro de 2010.

Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz

Os resultados da última eleição brasileira foram analisados em letras, números e gráficos por jornalistas, comentaristas, editorialistas, cientistas políticos e outros. Os vários aspectos do pleito foram virados e revirados de modo a formar por vezes uma unidade orgânica, outras vezes um aranzel inextricável.

Entretanto alguns fatores, se não estiveram inteiramente ausentes dos comentários, ficaram ao menos na sombra. E como tais fatores são decisivos para se compreender o resultado das eleições, é necessário pô-los em realce, sob pena de vermos de modo estrábico o que de fato ocorreu naqueles dias atribulados da campanha eleitoral, como também o seu desfecho.I

Influência católica nas mentalidades



As estatísticas falam por si

A mídia e os institutos de pesquisa timbram de modo geral em pôr ao alcance de seus leitores dados que mostram a decadência da prática e sentimento católicos na população. Estatísticas que apontavam o Brasil com mais de 90% de católicos, na década de 1950, hoje nos dizem melancolicamente que essa porcentagem caiu a 70%, ou talvez menos.

De um lado não há como negar essa realidade, mesmo porque muitos católicos, não encontrando mais na pregação de sacerdotes aggiornati o pão da verdadeira doutrina tradicional, procuram refúgio, ainda que equivocadamente, em seitas protestantes e outras.

Mas de outro lado o resultado das pesquisas e conseqüente propaganda midiática, mesmo quando verdadeiro, limita-se à superfície da realidade. Séculos de doutrina e moral católicas influenciaram beneficamente o Brasil, modelando a fundo as mentalidades e os hábitos da população. A tal ponto que mesmo os que se dizem não-católicos ou não-praticantes pensam e agem de fato, em não poucas circunstâncias, como a  Igreja lhes ensinou.

Também nesse aspecto mais profundo das mentalidades a corrosão secularista se faz sentir, e disso não devemos ter ilusões. Mas o processo aqui é mais lento e menos abrangente do que na superfície, de tal modo que coágulos de catolicidade e bom senso permanecem com maior ou menor intensidade nas almas, dependendo do indivíduo, das famílias, da região. Só muito lentamente eles vão se dissolvendo pela ação secular, ao longo dos anos, das décadas, quiçá dos séculos.

Rejeição ao aborto: bandeira de uma luta mais vasta

Nessas circunstâncias , se algumas vozes se levantam – com autenticidade, e por vezes também com autoridade – para defender um ou mais pontos da verdade que estava sendo corroída, pode produzir-se de repente um sobressalto salutar nas almas que estavam sendo trabalhadas pelo adormecimento. Conforme o caso, tal sobressalto pode reavivar fibras que se diria mortas, ou pelo menos em adiantado estágio de liquefação mórbida. Então o doente adquire laivos de sanidade, o catacego começa a ver nitidamente, e o sonolento pode mudar toda uma situação que parecia inamovível.(1)

A questão do aborto emergiu contra as expectativas da esquerda

Muito disto pudemos presenciar durante a última campanha eleitoral. Ante uma certeza de vitória da candidata Dilma Rousseff no primeiro turno, o combate ao crime do aborto foi o catalisador em torno do qual se reuniram as reações mais fortes e mais sadias às pretensões da petista.

Mas não foi só a defesa da vida. Conforme observou com sagacidade e profundidade o filósofo Vladimir Saflate, professor da Universidade de São Paulo (USP), “a candidatura Serra começou a crescer de verdade quando o Serra resolveu flertar com setores conservadores da sociedade brasileira,– teve votação expressiva no chamado cinturão do agronegócio – e também com a fina flor do pensamento conservador. […] Mostrou uma coisa que a gente não sabia: existe um pensamento conservador forte no Brasil e esse pensamento tem voto. Pode ser mobilizado por questões relativas à modernização dos costumes. […] Serra destampou uma franja eleitoral que estará presente no debate nos próximos quatro anos. Esse tipo de pauta não vai desaparecer. […] Até porque existe uma tendência mundial de construir um pensamento conservador que tem forte densidade eleitoral. A gente vê isso nos EUA, na Europa e vai ver no Brasil de uma maneira ou de outra. […] Não foi simplesmente uma questão ligada ao aborto. Foi uma maneira que o pensamento conservador encontrou de pautar a agenda do debate político neste país”.(2)

Ou seja, o combate ao aborto foi a bandeira que simbolizou e compendiou uma luta mais vasta contra o “casamento” homossexual, contra a adoção de crianças inocentes por “casais” constituídos de modo anti-natural, contra a eutanásia, contra as invasões de terras e de prédios, em defesa da propriedade privada, em favor das liberdades individuais legítimas. Numa palavra, contra o malfadado Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) do governo Lula.

Com muita propriedade, afirmou em artigo para a “Folha de S. Paulo” o Príncipe D. Bertrand de Orleans e Bragança: “O tema do aborto despontou com ímpeto chamativo. Mas foi a panóplia de metas radicais do PNDH-3 (Plano Nacional de Direitos Humanos) o que maior apreensão causou em vastos setores da sociedade”.(3)

Clérigos e leigos se opuseram com valor

Esta luta teve figuras proeminentes como D. Aldo Pagoto, Arcebispo da Paraíba, D. Luiz Gonzaga Bergonzini, Bispo de Guarulhos, D. Benedito Beni dos Santos, Bispo de Lorena, sem falar de ainda outros bispos e diversos sacerdotes que fizeram pronunciamentos corajosos e incisivos. Por mais que essas personalidades eclesiásticas tenham tido uma atuação digna de louvor – e elas a tiveram –, por si sós não teriam conseguido mudar o ambiente eleitoral, não fosse uma verdadeira avalanche de oposição que se levantou também entre os leigos.

Tal oposição brotou do fundo de uma opinião pública contrariada, à qual há muito tempo vinha sendo negado pão e água. Contrariada sim, por não se ver representada em nenhum dos postulantes ao principal posto político da Nação.

Essa situação tão inesperada para os partidos políticos, especialmente para o PT, não só levou a decisão eleitoral para o segundo turno, como pôs em grave risco a vitória de Dilma Rousseff. O fato é confessado sem rebuços pelo próprio presidente do PT, José Eduardo Dutra, o qual “admitiu ao Estado que o PT temeu uma derrota na primeira semana do segundo turno, quando as pesquisas internas mostravam uma diferença de apenas cinco pontos porcentuais entre Dilma e José Serra”.(4)

Diante de uma opinião pública em grande parte inconformada com os rumos esquerdistas dos candidatos, tanto Dilma Rousseff quanto José Serra viram-se obrigados a revestir-se de aparências de devoção, na tentativa de capitalizar a forte corrente de opinião que eles de nenhum modo representavam. O eleitorado se vingava, pelo fato de não haver nenhum candidato conservador que espelhasse seus sentimentos e inclinações,(5) e os candidatos reagiram com uma farsa. Dilma Rousseff, tida como mais favorável do que José Serra ao aborto e às demais medidas do PNDH-3, foi a mais visada pelos anti-abortistas.

A campanha anêmica de Serra e o pronunciamento do Papa

Nesse clima, em que uma virada eleitoral parecia provável ou pelo menos francamente possível, aconteceu o inesperado. A campanha de José Serra, em lugar de avançar, recuou, desbotou-se, ficou ainda mais morna, mais anêmica, não aproveitou os temas que o eleitorado lhe oferecia de bandeja. É como se ele estivesse desinteressado de vencer.(6)

A essa altura deu-se um fato de grande porte que poderia ter mudado completamente o jogo eleitoral, se aproveitado convenientemente pela oposição. Referimo-nos ao pronunciamento do Papa Bento XVI, que inequivocamente se aplicava à situação então vivida pela Nação. Falando aos bispos brasileiros da Regional Nordeste 5 (Maranhão), reunidos em Roma em visita ad limina apostolorum em 28 de outubro, assim se expressou o Pontífice (excertos):

“Quando os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem, os pastores têm o grave dever de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas. […] Seria totalmente falsa e ilusória qualquer defesa dos direitos humanos políticos, econômicos e sociais que não compreendesse a enérgica defesa do direito à vida desde a concepção até à morte natural. […]

Quando os projetos políticos contemplam, aberta ou veladamente, a descriminalização do aborto ou da eutanásia, o ideal democrático – que só é verdadeiramente tal quando reconhece e tutela a dignidade de toda a pessoa humana – é atraiçoado nas suas bases (cf. Evangelium vitæ, 74). Portanto, caros Irmãos no episcopado, ao defender a vida ‘não devemos temer a oposição e a impopularidade, recusando qualquer compromisso e ambigüidade que nos conformem com a mentalidade deste mundo’ (ibidem, 82). […]

“Em determinadas ocasiões, os pastores devem mesmo lembrar a todos os cidadãos o direito, que é também um dever, de usar livremente o próprio voto para a promoção do bem comum (cf. GS, 75). Neste ponto, política e fé se tocam. […] Deus deve ‘encontrar lugar também na esfera pública, nomeadamente nas dimensões cultural, social, econômica e particularmente política’ (Caritas in veritate, 56)”.(7)

PT se esforça por esvaziar a repercussão das palavras do Papa

Houve quem lamentasse o fato de o pronunciamento papal não ter vindo com maior antecedência: “O discurso do Papa Bento 16 só iria fazer eco se fosse feito duas semanas atrás”, comentou na ocasião o missivista Eduardo Ramirez.(8)

Pode-se pensar assim. Porém é certo que, mesmo com um prazo exíguo, se a oposição tivesse dado de imediato ampla repercussão e irrestrito apoio ao pronunciamento papal, poderia ter contribuído decisivamente para a reviravolta eleitoral, pois ele condizia com os aspectos mais profundos e mais negados da opinião pública nacional. Ao contrário disso, o candidato oposicionista tratou pouco e desbotadamente das palavras de Bento XVI, nem sequer citando-as no último debate televisivo com Dilma Rousseff. Por que isso? É um mistério a ser desvendado.

O PT entendeu melhor o risco que trazia para sua candidata tal pronunciamento. Não podendo contestá-lo, porque seria um suicídio eleitoral, procurou esvaziá-lo de significado o quanto pôde. Assim, comentou o Presidente Lula: “Eu não vi nenhuma novidade na declaração do Papa. Esse é o comportamento da Igreja Católica desde que ela existe. Isso pode ser falado a qualquer momento, ontem, hoje, amanhã, depois de amanhã. Toda vez que você perguntar ao papa sobre a questão do aborto, ele vai dizer exatamente o que disse ontem”.(9) Seguindo o mesmo diapasão, a então candidata Dilma Rousseff disse apenas que a fala do Papa tem de ser respeitada: “Ele tem o direito de se manifestar”.(10) Não podia dizer menos. Era só o que faltava ela negar ao Papa o direito de se manifestar!

Divisão no Episcopado sobre aplicação das palavras de Bento XVI

O mais surpreendente foi que também a CNBB, da qual se deveria esperar que ecoasse fortemente as palavras do Papa, pelo contrário procurou minimalizá-las. Para começar, oficialmente a CNBB “não se pronunciou sobre o assunto”.(11). Alguns de seus membros mais representativos o fizeram. Vejamos o que disseram:(12)

O vice-presidente da entidade, D. Luiz Soares Vieira, “afirmou em entrevista à Rádio Vaticano, em Roma, que a Igreja já está cumprindo a orientação dada pelo papa Bento XVI: ‘A Igreja não tem posição partidária e o papa não está dizendo que se deve votar em um ou em outro candidato’, observou D. Luiz Vieira, acrescentando que, ‘como os dois candidatos (Dilma Rousseff e José Serra) têm praticamente a mesma posição diante do aborto, é complicado fazer a escolha’”.

Para o bispo de Limeira, D. Vilson Dias de Oliveira, porta-voz do Regional Sul 1 da CNBB, “não se trata de fazer uma cruzada na véspera e no dia das eleições, porque não é disso que o papa está falando. Estamos seguindo a orientação do papa, porque já vínhamos trabalhando na conscientização dos eleitores, sem apontar nomes de partidos ou de candidatos”.

O bispo de Jales, D. Demétrio Valentini, disse que “se deve evitar a tentação de achar que o papa está interferindo na política brasileira. O bom da democracia é cada um poder votar de acordo com a sua consciência”.

Ou seja, para esses representantes da CNBB, a orientação do Papa não trazia nada de novo e não deveria influir nas eleições. Com outras palavras, é a mesma posição do presidente Lula. Uma tão clara condenação do Papa ao aborto, uma defesa tão contundente do dever dos bispos de emitir juízos morais em matérias políticas, uma insistência sobre a necessidade de usar o voto para promover o bem comum – tudo isso parece não significar nada de especial para a CNBB.

Não estranha, pois, ser já considerável o número de bispos que não mais se sentem obrigados a seguir a orientação desse colegiado episcopal em diversas matérias. A divisão na CNBB se afigura irreversível: “Polêmica do aborto faz bispos racharem – Seja qual for o resultado no 2º turno, discussão deixará seqüelas na Igreja e poderá ter reflexos na eleição da CNBB”.(13)

Alguns pronunciamentos episcopais parecem até um escárnio à inteligência dos brasileiros, como o do Bispo de Caçador (SC), D. Luiz Carlos Eccel, que declarou em nota oficial publicada no site de sua diocese em 29-10-10: “Como Bispo da Igreja Católica, e como cidadão brasileiro, fico feliz por saber que nosso Presidente tem defendido a vida, e sempre se pronunciou contra o aborto. […] Nosso país está em pleno desenvolvimento e assim queremos continuar e, depois de 500 anos, nosso povo quer eleger, pela primeira vez, uma mulher que tem compromisso com a vida e provou isso com sua própria vida. […] Obrigado Santo Padre por suas sábias palavras! A Dilma é a resposta para as nossas inquietações a respeito da vida”.

A maioria do eleitorado não votou na candidata do PT

Outro ponto fundamental, não realçado pela mídia ao comentar o resultado do segundo turno das eleições, é o fato de que considerável maioria dos eleitores brasileiros não votou em Dilma Rousseff. A imprensa destacou que a candidata petista obteve 55.752.529 votos, equivalentes a 56,05% dos votos válidos. Correto. Acontece que o eleitorado brasileiro é muito maior do que a soma dos votos válidos. Ele inclui os brancos, nulos e abstenções.

O total do eleitorado é de 135.803.094. Isto significa que 80.050.565 dos brasileiros aptos a votar não votaram em Dilma Rousseff. Portanto, não votaram na candidata petista 58,9% dos eleitores, contra 41,1% que lhe deram seu voto. Ela vai governar um País em que uma boa maioria não a sufragou. Veja-se o quadro acima, elaborado segundo os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Voto contra-Dilma foi mais consistente do que o voto pró-Dilma

A essa consideração soma-se outra, de não menor importância. A vitória de Dilma se deveu em larga medida ao voto dos que recebem bolsa família. Já o resultado do primeiro turno mostrou essa realidade: “A candidata do PT à Presidência, Dilma Roussefff, recebeu proporcionalmente mais votos onde a cobertura do Bolsa Família é maior. Dos dez estados com maior índice de beneficiários do programa de transferência de renda, nove deram a Dilma votação suficiente para vencer já no primeiro turno. É o que mostra o cruzamento dos resultados da eleição presidencial, feito pelo GLOBO, com o endereço de quem recebe o Bolsa Família”.(14)

Como se vê, não se tratou de uma consonância ideológica com o socialismo da candidata do PT, nem com seu programa político, nem com as metas do governo. Prevaleceu simplesmente o interesse pessoal, cuja legitimidade se pode discutir no caso concreto, mas cuja realidade é inconteste.

Ora, a contrário senso, os que votaram contra Dilma Rousseff o fizeram, em larga medida, porque não concordam com seus princípios doutrinários ou morais, não apóiam seu projeto político, não confiam nas suas metas de governo e não desejam uma continuidade da administração Lula.

Portanto, a oposição (do ponto de vista da opinião pública, não dos partidos) que ela terá de enfrentar em seu governo é muito mais consistente do que o apoio; e também mais capaz de mobilização, mais consciente de suas idéias e preferências. Dilma não poderá ignorar essa circunstância fundamental, sob pena de ver repetido no Brasil o que está ocorrendo com o governo Obama nos Estados Unidos, politicamente rejeitado até mesmo por muitos dos que o elegeram.

Que Nossa Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, ajude especialmente nossa Pátria nestes dias borrascosos em que vivemos.

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Notas:

1. Esta análise da opinião pública brasileira, procuramos hauri-la na escola de pensamento e ação de Plinio Corrêa de Oliveira, explicitada em várias de suas obras, particularmente no genial ensaio Revolução e Contra-Revolução.

2. Entrevista ao “Jornal Valor”, 7-11-10.

3. Insurreição Eleitoral, in “Folha de S. Paulo”, 28-10-10.

4. “Portal do Estadão”, 1°-11-10

5. Sobre essa sã oposição do eleitorado, de índole religiosa e moral, ver nosso anterior artigo “A opinião pública na gangorra da derrota ou vitória”, inCatolicismo, novembro/10.

6. Segundo “O Estado de S. Paulo” de 1-11-10, Serra erra ao optar pelo não-confronto. […] José Serra chegou ao final da segunda campanha presidencial […] abrindo mão de se apresentar como candidato de oposição. […] Serra falando coisas que o povo não queria ouvir e não entendia”. Na mesma data, o “Portal G1” (da Globo) noticiou: “Aliados de José Serra afirmaram que a oposição precisa se reorganizar. […] O governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), afirmou que será preciso ‘fazer uma oposição com seriedade’ daqui para frente”. O jornalista Fernando Rodrigues comenta: “Toneladas de papel e hectolitros de tinta serão usados para analisar a fragilidade da oposição. Um aspecto preliminar deve ser considerado a respeito desse raquitismo: a gênese da anemia” (“Folha de S. Paulo”, 30-10-10).

7.http://press.catholica.va/news_services/bulletin/news/26281.php?index=26281&lang=po

8.http://fratresinunum.com/10/10/29/a-reacao-do-episcopado-brasileiro-ao-discurso-do-papa-bento-xvi/

9. “Yahoo”, 29-10-10.

10. “Portal do Estadão”, 28-10-10.

11. “Folha de S. Paulo”, 29-10-10.

12. “O Estado de S. Paulo”, 29-10-10.

13. “Portal do Estadão”, 17-10-10.

14. “Diário do Pará”, 14-10-10.


O Estado de S. Paulo.

A pregação do bispo de Guarulhos , d. Luiz Gonzaga Bergonzini, contra a descriminalização do aborto e os candidatos favoráveis a essa prática deu resultado em sua diocese.

A campanha contra Dilma Rousseff e seu partido, o PT, virou o jogo no município do primeiro para o segundo turno: o tucano José Serra, que havia obtido 220.441 votos em 3 de outubro, venceu de virada com 311.328 votos – ou 50,95% – no dia 31. Dilma, ganhadora no primeiro turno com 248.526 votos, ficou com 299.757 – ou 49,05% – na contagem final.

“Atribuo esses resultados ao trabalho que fiz, de conscientização dos católicos, pois preguei a bandeira contra Dilma e contra o PT por motivos ideológicos, porque não aceito o aborto nem o casamento de pessoas do mesmo sexo”, disse d. Luiz Gonzaga, ao examinar o placar eleitoral do município de Guarulhos, cujo território coincide com o de sua diocese, que tem 36 paróquias.

O bispo promete ficar de “olhos e ouvidos bem abertos” para vigiar o comportamento da presidente eleita nos próximos anos, “já que ela se definiu como católica”, ao visitar o Santuário Nacional de Aparecida, em 11 de outubro. “Vou apoiar o que Dilma fizer de certo, mas reclamar, se ela falar algo que contrarie os direitos humanos, a cidadania, a liberdade de expressão e a moral”, adianta.

Jales

Na cidade de Jales, cujo bispo, d. Demétrio Velentini, criticou d. Luiz Gonzaga por causa do veto a Dilma, numa troca de cartas no âmbito do episcopado paulista que acabou repercutindo na imprensa, Serra ganhou com 15.753 votos (57,5%) ante 11.645 (42,5%) dados a Dilma na sede da diocese. Ela venceu, porém, nos números finais das 46 paróquias de Jales.

“Não pedi votos para ninguém, não mandei ninguém não votar em um ou outro candidato, porque os eleitores devem ter a liberdade de escolher”, disse d. Demétrio. O bispo não indicou nomes, limitando-se a recomendar, em artigos sobre as eleições, que os católicos votassem conforme sua consciência. Como eleitor e cidadão, ele assinou um manifesto de religiosos, artistas, intelectuais e líderes comunitários em apoio a Dilma.

Outro bispo que se declarou a favor de Dilma, d. Luiz Carlos Eccel, de Caçador, em Santa Catarina, registrou a vitória de sua candidata na sede da diocese, embora Serra tenha sido o vencedor na soma total das paróquias de outros municípios. Caçador deu 19.833 votos (51,5%) a Dilma e 18.641 votos (48,45%) a Serra. Contando todos os municípios da diocese , Serra obteve mais votos do que Dilma.

“Caçador é uma região de latifúndios, com muitos sinhozinhos Malta e predominância de boias-frias”, observou o bispo, ao explicar a derrota da petista em sua região. “Santa Catarina é um Estado retrógrado, que prefere as oligarquias e ainda tem saudades das cebolas do Egito”, acrescentou d. Luiz Carlos.

O bispo de Caçador informou que, antes de denunciar “calúnias” contra Dilma e manifestar apoio aberto à sua candidatura, fez uma pesquisa sobre a situação do País e os avanços no governo Lula. “Chequei tudo, não foi uma posição cega”, observou. “Dilma não foi a minha candidata no primeiro turno, não me vejam como um obcecado.”

“Decepção”

Na cidade de Anápolis (GO), onde Serra venceu Dilma com boa margem de votos – 99.738 ou 59,35% para o tucano e 68.316 ou 40,65% para a petista – o bispo emérito, d. Manoel Pestana Filho, festeja os números locais, mas lamenta o resultado da eleição. “Foi uma decepção humana, mas creio na Providência Divina e acho que Deus tem lá seus caminhos.”

Anápolis, município governado pelo PT, “cujo prefeito tem feito uma administração excelente”, na opinião de d. Manoel, abriga a Associação Pro- Vida, movimento que combate o aborto e também aconselhou os católicos a não votar em Dilma e em outros candidatos do PT.

Na Paraíba, cujo arcebispo , d. Aldo Pagotto, gravou um vídeo postado no YouTube, em 10 de outubro, denunciando o PT e sua candidata a presidente como abortistas,Dilma venceu nas urnas em João Pessoa, sede da arquidiocese, com 210,207 votos (58,47%) ante 149.331 (41.,53%) dados a Serra.

Resultados

50,95% é o porcentual de votos que Serra teve em Guarulhos no 2º turno

51,5% é o porcentual de votos de Dilma em Caçador (SC) no 2º turno, onde bispo a apoiou

46 é o total de paróquias de Jales em que Dilma venceu; na sede da diocese, Serra ganhou.

Daniel Martins

Recém-eleitos no Brasil: ouvidos abertos para a lição que lhes dá a esquerda americana! (Na foto, senador esquerdista Evan Bayh)

Evan Bayh, senador de esquerda dos EUA,  confessa em artigo para The New York Times (04/11/10) algumas verdades que servem bem de lição para os recém-eleitos no Brasil.

Com a vitória de Barack Obama em 2008, os democratas (que nos EUA representam a esquerda) acreditaram que uma onda esquerdista ia tomar conta de seu país. Mas a derrota nas eleições legislativas e estaduais do dia 02 de Novembro último deixou claro “que os democratas superestimaram o próprio poder”.

Continua o senador: “As pesquisas de opinião realizadas imediatamente após as eleições de 2008 revelaram que 22% dos eleitores se consideravam liberais, 32% viam-se como conservadores e 44% como moderados. Um eleitorado com 76% de moderados e conservadores não estava exatamente ansiando por uma guinada para a esquerda”.

Prova disso é que os democratas espantaram o eleitorado ao tentar impor a admissão de homossexuais nas forças armadas, poucas semanas antes das últimas eleições.

Os eleitos no Brasil devem tirar daí uma grande lição. Caso contrário, arriscam desmoronarem politicamente em futuro próximo.

Wagner Moura

“Pela segunda vez ouçam as Américas este grito: Eu morro, mas Deus não morre. Viva Cristo Rei!” –

Beato e mártir Anacleto González Flores, assassinado pelo mexicano Partido Nacional Revolucionário.

Na época em que um poder autoritário preparava, no México, uma encarniçada luta contra as liberdades, especialmente a religiosa, um leigo católico, casado, com filhos, advogado, jornalista, apóstolo da juventude e líder de diversos grupos sociais, morreu mártir.

Trata-se do beato Anacleto Gonzáles Flores que, em 1918 escreveu o texto Existe Esperança, pelo qual nos deixa como herança, hoje, uma palavra-chave: organização. Seu texto segue atualíssimo.

***

“Tudo está perdido”. Está é a frase que escapa dos lábios de muitos que não se deram o trabalho de estudar nossa situação e que ignoram ou aparentam ignorar que, tanto os indivíduos como os povos, são suscetíveis de regeneração. Sim; apesar do pessimismo e do desânimo de quase todos, da covardia, da preguiça e da desorientação, nós não desistiremos jamais de escrever palavras de esperança e de confiança de que o futuro pode ser nosso, que as classes sociais ainda podem render uma homenagem de adoração a Cristo e que a pátria pode ser salva, ainda quando caminhe a largos passos para a pendente catástrofe e para a ruína.

Mas, “tudo conspira contra nós”, dizem alguns com tom de lamento; sim, é certo, tudo se conjuntura contra nós, mas o que devemos muito lamentar é que as loucuras, as paixões e a degradação dos homens se rebelam contra o único que é santo e digno de veneração que existe sobre a terra: a Igreja. O que devemos lamentar é que a grande maioria dos católicos esperam que o ressurgimento da Pátria seja obra só de Deus, o resultado prodigioso de um milagre; e não uma obra na qual haja, por uma parte, o influxo de nosso Criador, e por outra, um esforço humano com tudo o que este tem de forte e eficaz. Este tem sido o papel que mais temos feito, ou seja, o de meros espectadores sentados, que com todos os tons cantam elegias sobre as ruínas amontoadas pelo cataclisma. E não é, e nem deve ser este, o nosso papel: ainda há no elemento católico energias que podem ser postas em ação de tal maneira que se lhes lancem a lutar contra os sustentadores do mal e se empenhem pelo caminho da reconstrução; assim, se alcançará uma vitória completa e conseguiremos que o bem triunfe sobre o erro e mal.

Isto exige, desde agora, que todo os católicos se convençam de que é preciso sair da inércia em que até agora têm vivido, que é necessário deixar a preguiça, que é urgentíssimo entrar em ação, indispensável que nosso influxo se faça sentir forte e incontrastável sobre a sociedade para orientá-la e regenerá-la. Agora é urgente a necessidade de sair de todos os templos para ir em busca das almas, colocarmo-nos em contato com todas as classes sociais, iluminá-las com a doutrina da Igreja, para transformá-la com nosso exemplo, atraí-las com a caridade, e, sobretudo, organizá-la de uma forma que encontre remédio eficaz para suas misérias econômicas, intelectuais e morais por meio da associação que, como o tem demonstrado a experiência, é o grande poder que pode nos dar o triunfo.

A ação é o único que pode nos salvar; mas não uma ação que se limite a adorar a Deus, a freqüentar os sacramentos e a consagrar-se ao templo de um modo exclusivo e único; não, partindo da adoração e da vida sacramental, trata-se de desenvolver um movimento de caráter profunda e genuinamente cristão, que incida na vida social e política, e que tenha por sinais predominantes um amor forte e sincero a nossos irmãos inspirados no amor intenso e incalculável que devemos professar ao nosso Criador.

Consagremo-nos para a levar a luz ao horizonte obscurecido pela ignorância e pelo erro, conquistemos as classes sociais com um apostolado incansável e procuremos, o quanto antes, sacudir a inércia, associando-nos, organizando-nos, colocando em prática os ensinamentos da Igreja para contribuir, deste modo, para a salvação da Pátria.

Beato e mártir Anacleto González Flores, artigo do jornal La Palabra.
Guadalajara, México, 21 de julho de 1918.

Tradução de Diego Guilherme da Silva.

Vergonha! A liberdade de expressão cerceada por intenções explícitas e eleitoreiras…

E aí, “democratas”?

***

Em parecer assinado no dia 30 de outubro por Sandra Cureau, Vice-Procuradora-Geral Eleitoral, o Ministério Público Eleitoral (MPE), trantado sobre a apreensão do material impresso a pedido da Mitra Diocesana de Guarulhos, considerou que “afronta o regime democrático” caracterizar qualquer manifestação política como propaganda eleitoral.

O folheto intitulado “Apelo a todos os brasileiros e brasileiras” pede que os eleitores não votem em candidatos de partidos favoráveis à descriminalização do aborto e cita uma série de ações do Governo Federal e do Partido dos Trabalhos para legalizar tal prática monstruosa. O texto está assinado por três bispos da Regional Sul da CNBB.

A coligação “Para o Brasil seguir mudando” e Dilma Rousseff afirmam, em Ação Cautelar, que os panfletos “imputam ao Governo Federal, seu atual representante e à candidata por ele apoiada, Dilma Rousseff, a defesa da legalização do aborto perante a ONU, congressos partidários e Congresso Nacional. Tal panfleto veicula propaganda negativa, ilícita e preconceituosa, atraindo competência e atuação enérgica da Justiça Eleitoral”.

Para o MPE, o “regime jurídico não impede que grupos sociais manifestem suas opiniões ante ao pleito eleitoral e ao posicionamento dos candidatos a cargos eletivos e seus respectivos partidos”, pois, “admitir isso seria o mesmo que incompatibilizar a legislação eleitoral com o próprio regime constitucional”.

O parecer não concorda que o panfleto tenha incorrido em crime e afirma que propaganda eleitoral é aquela “elaborada por partidos políticos e candidatos com a finalidade de captar votos do eleitorado para investidura em cargos público-eletivo”.

Embora tenha caráter político e exprima posicionamento quanto às eleições, o folheto não indica em quem votar e seu conteúdo “não pode ser conceituado como propaganda eleitoral, pois não foi elaborado por candidato ou partido político.”

Sobre o tema do aborto ter sido levantado, o MPE considera que é “natural e saudável que temas como esse sejam debatidos durante o período eleitoral”, além de ser uma liberdade “assegurada pela ordem constitucional vigente e nada há de ilegal em escrutinar os posicionamentos dos partidos políticos, candidatos, apoiadores, sobre temas polêmicos, apenas porque se trata de período eleitoral.”

O Ministério Público afirma que a liberdade de expressão do pensamento não é ilimitada. “É vedado o anonimato e assegurado o direito de resposta e indenização por dano moral e à imagem. No caso concreto, o panfleto não é anônimo.”

Conclui o parecer com um pedido de revogação da medida liminar e a devolução de todo o material apreendido à Diocese de Guarulhos.

Do parecer da Procuradoria Geral Eleitoral, destaca-se:

  • “No entanto, esse regime jurídico não impede que grupos sociais manifestem suas opiniões ante ao pleito eleitoral e ao posicionamento dos candidatos a cargos eletivos e seus respectivos partidos. Admitir isso seria o mesmo que incompatibilizar a legislação eleitoral com o próprio regime constitucional” (p. 4).
  • “Dessa forma, afronta o regime democrático caracterizar qualquer manifestação política como propaganda eleitoral e, por essa via, submetê-la ao crivo do poder de polícia da Justiça Eleitoral, que, repita-se, deve ser exercido em caráter excepcional” (pp. 4-5).
  • “A manifestação de pensamento sobre o aborto ou qualquer outro tema – seja expressando posicionamento favorável ou contrário – é assegurada pela ordem constitucional vigente e nada há de ilegal em escrutinar os posicionamentos dos partidos políticos, candidatos, apoiadores, sobre temas polêmicos, apenas porque se trata de período eleitoral” (p. 5).
  • “Por todo o exposto, manifesta-se o Ministério Público Eleitoral, pela revogação da medida liminar concedida, com devolução de todo material apreendido à  Mitra Diocesana de Guarulhos” (p. 7).

E, ao menos, jurisprudência firmada.

Confira notícia no site do MPE, clique aqui.

Para ler o parecer na íntegra, clique aqui.

Não se pode mais pensar a democracia brasileira sem levar em conta a presença e participação de grupos religiosos na política partidária nacional, afirma o sociólogo  Ricardo Mariano da PUC-RS no Encontro Anual da Anpocs.

A reportagem é de Isabela Fraga e publicada pelo portal Ciência Hoje, 01-11-2010.

Ambos os turnos das eleições gerais deste ano, bem como as alianças dos candidatos à presidência e suas atitudes em relação às religiões, não deixam dúvida sobre o peso de grupos religiosos – especialmente neopentecostais – na definição da política brasileira atual.

“Não podemos mais pensar a democracia brasileira sem levar em consideração a participação e presença desses grupos na política partidária nacional, nas alianças e barganhas que fazem com candidatos, partidos e governantes”, afirma o sociólogo Ricardo Mariano, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS).

Mariano participou de uma mesa-redonda sobre o assunto no 34º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), que aconteceu na semana passada em Caxambu (MG).

Para o sociólogo, o eleitorado pentecostal sem dúvida teve importância no número inesperado de votos que a candidata pelo PV Marina Silva teve no primeiro turno das eleições presidenciais, embora, segundo o Datafolha, apenas 1% dos eleitores tenha respondido que a religião teve influência no seu voto.

No segundo turno, entretanto, Mariano diz-se surpreendido pelo fato de os pentecostais apoiarem mais o candidato José Serra (PSDB) do que Dilma Rousseff (PT), de acordo com pesquisas eleitorais. “O perfil socioeconômico desse grupo religioso – que tem escolaridade mais baixa que a média brasileira – indica tendência a votar mais na candidata Dilma”, defende.

Isso significaria, para o sociólogo, que há motivos religiosos levados em consideração por parte do eleitorado pentecostal, o que faz com que este apoie mais o Serra do que a Dilma. Entre esses motivos, estaria certa insatisfação com o governo Lula, por conta de iniciativas como o plano nacional contra a homofobia, que de modo geral são rechaçadas pelos evangélicos.

Mariano afirma que o Brasil vive hoje um estado de “quase laicismo”, no qual “todos [os grupos religiosos] querem regular a laicidade e sua manipulação pelo Estado”. A afirmação foi feita a partir não só de observações sobre as eleições, mas também sobre o acordo com o Vaticano assinado pelo presidente Lula em novembro de 2008 com o objetivo de regulamentar o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, e sobre a Lei Geral das Religiões, proposta por um parlamentar evangélico. Esta, segundo o sociólogo, estendeu o acordo católico a todas as religiões do Brasil sob o argumento de isonomia religiosa.

Surgimento do ‘irmão vota em irmão’

O crescimento do número de parlamentares evangélicos nos últimos anos é vertiginoso e acompanha o número de pentecostais na população em geral. Segundo dados do IBGE, de 1991 a 2000, a porcentagem de pentecostais na população brasileira cresceu de 5,6% para 10,4%. Entre 2002 e 2006, o número de deputados pentecostais saltou de 2 para 18.

Fica visível que esse crescimento é recente. Segundo Mariano, tanto os pentecostais quanto os evangélicos em geral (denominação que abrange tanto pentecostais quanto protestantes históricos) se excluíam da vida política até a década de 1980.

A reviravolta se deu às vésperas da Assembleia Constituinte, em 1986, quando circularam fortes boatos de que a nova constituição brasileira, sob influência da Igreja Católica, colocaria em risco a liberdade religiosa. “Por isso, os evangélicos, mesmo na política, costumavam defender a bandeira de Estado laico”, explica Mariano.

Desde então, a bancada evangélica no parlamento passou a ser formada majoritariamente por neopentecostais – principalmente por integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus e da Assembleia de Deus. “Nessas eleições, contudo, essa clivagem entre pentecostais e neopentecostais não existe”, afirma o sociólogo

Reinaldo Azevedo

Os mapas abaixo se referem às eleições de 2002, 2006 e 2010. Nos estados pintados de vermelho, o PT venceu a DISPUTA PRESIDENCIAL no segundo turno. Nos estados pintados de azul, a vitória foi tucana. Os dados falam por si.

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Comparem agora o mapa do segundo turno de 2010 (o terceiro, acima) com o Brasil segundo o que apontava o Ibope no dia 2 de outubro (mapa abaixo à esquerda). No mapa à direita, o que revelaram as urnas no dia 3.

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Correio Braziliense

O arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, afirmou nesta terça-feira (2) que a Igreja Católica saiu fortalecida após as eleições presidenciais deste ano.
Ele negou que a instituição tenha apoiado um ou outro candidato e disse que isso ocorreu apenas de forma individual ou em grupos específicos. Dom Orani celebrou missa pelo Dia de Finados, no Cemitério São João Batista, na zona sul da cidade.

“A Igreja soube fazer declarações bastante equilibradas, soube orientar seu povo para escolher da melhor maneira possível, não se desgastou, tomando partido aqui ou acolá, e os grupos que se manifestaram foi por sua própria conta. Eu acho que a Igreja sai muito mais forte, muito mais presente, muito mais equilibrada e, ao mesmo tempo, com um povo que soube se manifestar por todos os lados.”

O arcebispo considerou naturais as mensagens divulgadas pelo papa Bento XVI e pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), orientando os fiéis na reta final das eleições.

“Aquilo que o papa colocou e que a Igreja Católica tem colocado é que a pessoa tenha consciência ao votar, que vote bem e que examine todos os projetos dos candidatos. Nossa missão, o trabalho de orientar, foi em plena sintonia com a CNBB, a arquidiocese e o papa. Creio que as pessoas entendem muito bem e sabem escolher conforme sua convicção.”

Dom
Orani disse discordar das críticas de que a Igreja não deveria se pronunciar em assuntos de política e defendeu o papel da instituição em períodos eleitorais.

“Eu creio que a Igreja, oficialmente, sempre teve pronunciamentos orientando os eleitores. Devemos distinguir aquilo que é orientação específica de um grupo – que aí é responsabilidade de cada um – e aquilo que é Igreja oficial, de orientar as pessoas nas suas consciências. O cidadão que tem fé também tem responsabilidade e o direito de se manifestar.”

Para o arcebispo, os pronunciamentos e apoios políticos nas eleições não causaram desgaste para a imagem da Igreja Católica no país: “A Igreja não apoiou nem um candidato nem outro. É uma interpretação errônea da posição da Igreja, que não tem candidatos nem partidos. A questão do desgaste depende de cada pessoa interpretar as coisas.”

Dom
Orani disse ainda o que espera dos candidatos que foram eleitos: “Que todos os governos eleitos, dos estados e do país, possam cumprir as promessas, fazer o melhor pelo país e o bem para o povo.”

Em referência ao Dia de Finados, o arcebispo do Rio defendeu os valores espirituais, em oposição ao acúmulo de bens materiais. “É um dia em que as pessoas podem pensar que a vida não termina no cemitério, mas que continua. Representa uma reflexão séria sobre nossa vida enquanto caminhamos, pois desse mundo não levamos o que acumulamos de bens. Então, devemos aproveitar cada momento para fazer o melhor possível e construir uma sociedade mais justa, mais humana e mais fraterna.”

O aborto foi determinante para o voto dos fiéis católicos – independentemente de sua escolha entre Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB).

A reportagem do Valor ouviu 22 pessoas presentes à missa das 8 horas celebrada ontem,domingo, na terceira maior basílica do mundo, o Santuário de Aparecida (SP), e todas caracterizaram a questão do aborto, levantada há pouco mais de um mês no debate público, como “muito influente” para o voto. Para 18 deles, o tema foi “determinante” na escolha do candidato, tendo a participação dos padres, em suas igrejas locais, “ajudado a nos certificar de nossas escolhas”, segundo uma das fiéis abordadas pela reportagem.

A reportagem é de João Villaverde e publicada pelo jornal Valor, 01-11-2010.

Tidas como secundárias numa campanha eleitoral à Presidência da República, questões como aborto e união civil de homossexuais foram caracterizadas como “fundamentais” pelo arcebispo de Aparecida, Dom Raymundo Damasceno de Assis, na semana passada, após retornar de viagem ao Vaticano, quando foi comunicado pelo papa Bento XVI que será nomeado cardeal ainda em novembro. Na ocasião, afirmou: “Há certos valores que são fundamentais para a convivência harmoniosa e pacífica do país, como a questão da vida, a questão dos direitos humanos, a questão da família e do matrimônio. Não são coisas secundárias. Isso é fundamental”.

O Valor acompanhou ontem a missa das 8 horas no Santuário de Aparecida, celebrada por Dom Raymundo. Em sua homília de quase uma hora, o futuro cardeal falou das eleições de maneira genérica. “Que nosso Senhor nos ajude a escolher nosso governante neste dia de eleições, e que depois nos auxilie a acompanhá-lo”, afirmou, pouco antes de convidar os fiéis, que lotaram o santuário, a contribuírem com ofertas à Igreja. Por meio de sua assessoria, o arcebispo afirmou que estava “cansado” do tema eleitoral, e que não se posicionaria mais sobre o tema.

O comportamento equilibrado e diversionista do arcebispo de Aparecida contracenou com a visão firme da maior parte dos fiéis que viajaram à Aparecida, distante 168 km da capital paulista e 594 km de Curitiba (PR), principais centros de origem das pessoas abordadas pela reportagem.

“Saber que Dilma é favorável ao aborto contribuiu muito para nosso voto no Serra no primeiro turno e é uma pena que não votaremos nele hoje (ontem)”, disse Valéria Betinardi, que falava também por sua filha mais velha, Caroline, que consentia com gestos afirmativos com a cabeça. “Além disso”, afirmou Valéria, “o padre da igreja que frequentamos em Ribeirão Preto fala em todas as missas para não votarmos na Dilma”. Mas o padre cita o nome da candidata petista? “Fala, com todas as letras. E ainda avisa que não teme ser processado, porque luta pela vida”, respondeu Valéria.

Motivação semelhante foi apresentada pelo casal Gilberto e Maria Edna Gurski, comerciários da pequena cidade de Assis Chateaubriand, no interior do Paraná. Votaram em Beto Richa (PSDB), para governo de seu Estado, e Serra, para presidente, no primeiro turno, e repetiriam o voto ontem, caso não tivessem viajado à Aparecida. “Era preciso vir a esta missa, mas é uma pena deixar de votar no Serra”, disse Gilberto, para quem o PT, partido de Dilma, “deve ser evitado de todas as formas”. Sua esposa, Maria Edna, afirmou que o tema do aborto foi “determinante” para sua escolha no primeiro turno.

Mesmo eleitores de Dilma acusavam a “aprovação do aborto” como ponto fraco da candidata. Aides Aguis, auxiliar de estocagem de Curitiba, votou em Dilma no primeiro turno, e votaria ontem se não precisasse justificar seu deslocamento geográfico. Mas reclamava do aborto, que não deveria ter sido trazido ao primeiro plano. “Meu cunhado não tinha carro, geladeira, televisão e casa própria, antes do Lula assumir. Agora ele têm tudo e sabe que é graças ao governo. Mas não vota na Dilma porque não gostou de sua posição sobre o aborto”, disse.

Segundo Delestina Carrijo, dona de casa de Uberlândia (SP), eleitora de Dilma, a questão do aborto “grudou como cola nela, e afastou uma série de colegas”.


“A culpa é do Nordeste.”

A região “só nos … Quem, aliás, “é a favor de jogar uma bomba no Norte e (principalmente) no Nordeste” levanta a mão.

Mas “deplorável” mesmo “é pensar que o Nordeste escolhe o presidente, mas nós que pagamos a conta”.

Injuriados com a escolha do sucessor de Lula, simpatizantes do tucano José Serra decidiram atacar a região que, desde o começo da campanha, deu a Dilma Rousseff (PT) larga folga nas intenções de voto.

Essas declarações foram coletadas entre 20h e 21h deste domingo, após uma busca no Twitter por mensagens com a palavra “Nordeste”.

Algumas mensagens criticam a desqualificação dos nove Estados, tratados por muitos como um país à parte. Mas a maioria dos tuítes responsabiliza os nordestinos pela “derrota da democracia” nas urnas.

No Nordeste (25% dos eleitores brasileiros), a petista tinha, na antevéspera das eleições, 63% das intenções de voto, contra 30% do tucano, segundo pesquisa Datafolha.